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Gerando Valor com a TI

Marcos Sousa


“Gerar valor! Gerar valor! Gerar valor!”, é o mantra das organizações, repetido nas orações diárias do gerente de TI (CIO), e, paradoxalmente, em vez de trazer paz de espírito, só dá agonia. Na verdade, esta não é exclusiva do CIO, mas dos profissionais de TI nas suas mais diversas funções. Adianto que há solução, mas é preciso tomar decisões nem sempre as mais agradáveis.


Como falei no artigo “O Maior Abandonado”, meu objetivo é trazer mais dúvidas do que respostas (mas sempre dou um “palpite” que talvez ajude). Sei que ao abordar este assunto, do modo como farei, trafegarei em terreno minado, por isso, visando dar mais clareza, acho relevante um passeio no tempo. Vamos nós.


Estamos em 1990, no escritório da Ceará Industrial, indústria de beneficiamento de algodão e produção de óleo de cozinha, na qual meu pai é diretor. Aqui, um posto de trabalho demanda equipamentos de uso individual (a depender da função) tais como, uma máquina de datilografia, um telefone, uma máquina de calcular e papel para anotações e rascunhos. Uma máquina de Xerox, um fax e um telex, são compartilhados por toda a empresa, com manutenção terceirizada, sob demanda, e quase sempre sem contratos de manutenção. Os equipamentos “duram até se acabar”.


A formação demandada dos profissionais da administração é o curso científico completo (se isso tudo) e, a depender da função, experiência comprovada em datilografia ou boa caligrafia. A exigência de curso superior, ou um curso técnico específico, restringe-se a “patota” do laboratório de análise e ao contador.


A guarda da documentação (informação) restringe-se a alguns controles pontuais ou documentação legal, como tabelas de produção, de custos, folha de pagamento, livros caixa, documentos fiscais (notas e canhotos) e contábeis. Não há redundância de informações, pois de cada documento há uma única versão. O controle de acesso e a segurança patrimonial é realizada pelo vigia (segurança física) e os bens de valor, armazenados em um cofre. A empresa fatura bem, roda seus processos com eficiência (assim diz meu pai), e as maiores preocupações são com as vendas, com a compra do algodão para todo o ano, no período da safra, com o custo e a otimização dos processos industriais. Na verdade, este cenário descreve a maior parte das empresas do mundo, com pequenas variações, a depender do tamanho e setor.


Vamos entrar no nosso DeLorean1 e vamos avançar até 1995. Começam a proliferar os microcomputadores. Estão chegando nas organizações prometendo otimização, produtividade e redução dos custos.


Avancemos um pouco mais no tempo para vermos os fantásticos resultados. O posto de trabalho agora demanda um computador (com licenças agregadas) para cada profissional, que se torna obsoleto muito rapidamente, demandando novas compras, mesmo antes de comprovarem para o que vieram, diferentemente da máquina de datilografia.


ERPs e sistemas especialistas são oferecidos, trazendo mais controle, mais produtividade, mais integração, cortes de pessoal, custos de manutenção, atualizações recorrentes, e dependência de terceiros (fornecedores). E ainda, uma proliferação de versões de planilhas e documentos, com baixíssimo controle, que demandam mais áreas de discos.


Para gerenciar todos estes benefícios criou-se um departamento, com profissionais especializados, mais caros, eventualmente disputados a tapas, com qualificações que mudam a cada nova onda tecnológica. Foram definidos e implantados processos de governança, de suporte, de integração dos mais diversos sistemas, adquiridos softwares para gerenciar toda esta complexidade (zorra, para os mais íntimos), baseados em frameworks mágicos, que demandam certificações, etc. E, à segurança, foram adicionados firewalls, políticas e advogados.


O trabalhador, na maioria das funções, tornou sua formação mais cara. Precisou adicionar conhecimentos de tecnologia, ter um computador em casa (com todos os custos a ele associados), custos com certificações, formações especializadas. Quem não pôde bancar isso, viu o fosso da desigualdade aumentar.


Desembarcando do nosso DeLorean, agora no presente, é possível avaliar que toda esta mudança trouxe, em um curtíssimo prazo, um aumento significativo nos custos, uma mudança nos processos e na estrutura das empresas. A construção desta estrutura é cara (computadores, rede, servidores, licenças, softwares, conectividade etc.), e uma vez estabelecida, o custo de troca é muito alto.


Assim, a solução mágica da eficiência, da produtividade e da redução de custos, trouxe atrelado aos benefícios, um custo recorrente que não existia, complexidade na gestão, inclusão de terceiros nas decisões e um novo “culpado”, a TI, que precisa gerar valor para pagar uma conta que não é só sua.


“Agora, fodeu!”, dirá você. Quase! Acredito que a sinergia (nome bonito!) entre os entes da organização é a solução, mas é uma crença, mesmo com boa base teórica e de vida. Digo crença, pois considerando um mundo em que competir é a regra, só mesmo tendo fé.


Vejo três agentes fundamentais para enfrentar estes desafios: o dono2 da empresa, o CIO e a indústria da tecnologia.


O dono da empresa que precisa entender:


  • Que a gestão e a governança da tecnologia são complexas, e que precisa entender deste processo, visto que grande parte dos processos da sua empresa, se não todos, são executados em ambiente tecnológico. Ou seja, a TI é uma área que dá sustentação operacional a todas as outras. Assim ele deve “sair da zona de conforto” e se inteirar deste processo. O CIO é o parceiro fundamental;


  • Que cabe a ele mediar o debate da partilha dos recursos da organização definindo critérios objetivos para os investimentos em tecnologia. Quanto mais entender do processo mais eficaz será. Se fizer, e cobrar dos seus gestores, as três perguntas mágicas “para que serve?”, “quanto custa?” e “qual o ganho/benefício para a empresa?”, vai garantir racionalidade no uso dos limitados recursos. Sem isso vai apenas empilhar demandas desconexas na fila da TI;

  • Que os custos com TI, reforçando o item anterior, não foram/são inventados pelo CIO, mas são frutos dos projetos/estratégias aprovados para atender as diversas áreas, ou, como mostrou nossa história, impostos pelo mercado. Sem investimentos, submeterá a empresa a um desastre anunciado;


  • Que os fornecedores impostos pela evolução tecnológica, goste ou não, são peças-chave, portanto, são aliados e não adversários. Assim, deve tratá-los com respeito e orientar o CIO a fazer o mesmo;

  • Que desconsiderar o seu papel de liderança deste processo não é dar autonomia, nem é atração ao risco, é irresponsabilidade, para dizer o mínimo.


O CIO por sua vez tem que ter clareza:


  • De que a tecnologia traz um custo recorrente associado, portanto deve fazer coro com o dono, e exigir critérios bem definidos para saber se vale ser feito o investimento. Isso no mínimo dá racionalidade aos poucos recursos e a agenda da equipe;

  • Que é possível potencializar os recursos já contratados. Não é raro vermos produtos subutilizados, produtos diferentes que fazem a mesma coisa, ou “soluções” as quais a maturidade da empresa não comporta. É possível encontrar muita coisa boa “dentro de casa”, já encontrei, e com excelentes resultados;


  • Que manter a disponibilidade dos serviços gera muito valor. Garantir o atendimento dos clientes, sustentar as operações dentro do SLA, sistemas sem erros, otimização e uso racional dos ativos não é pouca coisa, e tem muito o que ser feito. Isso é respeito aos investimentos realizados. O potencial profissional que isso traz é enorme, no mínimo credibilidade;

  • De que novas tecnologias podem trazer benefícios tanto para a empresa quanto para o seu desenvolvimento profissional, mas é imprescindível avaliar a sua aderência e relevância, novamente a tal da sinergia. Este é a meu ver, o maior desafio pessoal do CIO;

  • Da importância dos fornecedores. São os mais qualificados para identificar melhorias e gaps nos serviços contratados. Por isso deve ser criterioso na sua seleção e desenvolver uma parceira ganha-ganha e não uma caracu. Eles têm metas de vendas, é verdade, mas a otimização de um serviço também lhes interessa, pois pode aliviar os seus custos operacionais.


Finalmente, quanto à indústria da tecnologia, esta não está preocupada com sua empresa em especial e, como um “traficante”, buscará torná-la o mais dependente de suas soluções, através de novos produtos, elevando o custo de troca3 e imenso marketing. É um setor que movimenta bilhões e impulsiona ao seu redor outros mercados, igualmente complexos, como consultorias, terceirizações, segurança, modelos de gestão, que também se alimentam de mudanças. O fornecedor, novamente ele, representante qualificado da indústria, pode lhe ajudar a filtrar esta enorme oferta, e isso tem muito valor.


“Macho, você é absolutamente pessimista!”, dirá você. Afirmo categoricamente que não, apenas realista, e acredito, piamente que é possível estabelecer esta sinergia. A chave está na resposta à pergunta: se temos e-mail, WhatApp, Instagram, Chat Bot, Website, BI, ferramentas de colaboração, por que 76% das empresas apresentam a comunicação como um entrave ao seu desenvolvimento4?"


A minha resposta é a do Eliyahu Goldratt5, “a tecnologia é necessária, mas não suficiente”, é preciso estar adequada ao uso. Construir este consenso não cabe apenas ao CIO, mas à comunidade organizacional. CIO, dono, às diversas áreas da empresa, fazem parte da resposta e todos precisam sair da “zona de conforto”. Apresentar as possibilidades e riscos da tecnologia é responsabilidade do CIO, a sua adequação/necessidade para a empresa é fruto da participação de todos, inclusive assumir a responsabilidade das decisões e dos riscos.


1 DeLorean é a marca do carro no qual os personagens Marty Mcfly e o “Doc” Brown trafegam no tempo no filme “De Volta Para o Futuro”.
2 A maioria das empresas no mundo são familiares e a gestão é muito personalista e são eficientes. Por que as empresas familiares são tão importantes para a economia mundial | CFEG (https://cfeg.com/insights_research/porque-as-empresas-familiares-sao-tao-importantes-para-a-economia-mundial)
3 Vale ler sobre o assunto, para entender a responsabilidade da adoção de uma solução e de que preço não deve ser o primeiro critério de seleção de um produto.
5 Conceito extraído do livro “Necessária sim, mas não suficiente”.



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